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Wednesday, June 01, 2005

EDWARD WESTON - Vivendo Fotograficamente


Auto retrato - Califórnia- 1911
EDWARD WESTON
(1886 - 1958)

Cada meio de expressão impõe seus próprios limites ao artista, limites que são inerenes aos utensílios, aos materiais ou mesmo aos processos que utililiza. Nas formas de arte mais antigas esses confins naturais estão tão bem estabelecidos, que se dão por supostos. Escolhemos a música ou a dança, a escultura ou a escrita, porque sentimos que, dentro de seus limites, este será o meio mais adequado para expressar aquilo que desejamos comunicar.

O padrão da fotopintura.

A fotografia, apesar de já ter completado seus 100 anos, ainda precisa conseguir essa familiaridade. Para entender isto, devemos examinar rapidamente o passado dessa nova arte. Os primeiros fotógrafos que desejaram realizar um trabalho criativo não contaram com uma tradição na qual se basear e, rapidamente, começaram a tomá-la emprestada da pintura. A convicção de que a fotografia era uma nova classe da pintura, de que seus praticantes planejavam, por qualquer meio, conseguir efeitos pictóricos com a câmera foi crescendo. Este falso conceito foi responsável por se cometer, em nome da arte, uma enorme quantidade de horrores, desde cenas alegóricas até estonteantes formas desfocadas.
Mas, não só isso foi bastante para atrasar o desenvovimento da fotografia. O verdadeiro dano reside no fato de que esse falso objetivo se estabeleceu com tanta firmeza, que a meta de todo o empenho artístico se converteu na produção de foto-pinturas ao invés de se converter em fotografias. O envolvimento aos meios que se adotou estava tão distante de sua verdadeira natureza que, cada avanço básico obtido nos processos, se convertia em mais um obstáculo para os fotógrafos pictorialistas. Assim, a influência da tradição pictórica retardou o reconhecimento do verdadeiro campo criativo oferecido pela fotografia. Aqueles que deviam ter se sentido mais envolvidos na investigação e na exploração dos novos recursos pictóricos, os ignoram completamente e, sua preocupação para produzir pseudo-pinturas, os afastava, mais e mais radicalmente, dos valores fotográficos.
Tanto foi assim que, quando desejamos reunir as melhores obras do passado, muitas vezes precisamos escolher exemplos entre os trabalhos daqueles que, no início, não se preocupavam com a estética. Será entre as obras dos primeiros retratistas que utilizavam as técnicas do daguerreótipo; entre os documentos da guerra (da Secessão) e da conquista de novas terras; entre os trabalhos de amadores e profissionais, que praticavam a fotografia por si mesma - sem se preocupar se era ou não era arte o que faziam - onde encontramos fotografias que podem ser comparadas com o melhor do trabalho contemporâneo.
Mas em lugar dessa evidência, que agora podemos apreciar com calma e com olhos históricos, o trabalho criativo que se faz atualmente é, com frequência, tão confuso quanto aquele de 80 anos passados. A tradição pictórica persiste por culpa da utilização de artifícios, da manipulação de negativos e de composições regidas por leis pré-estabelecidas. Só quem pensa em levar uma peneira para retirar água do poço é incapaz para ver o resultado ridículo que resulta da escolha de uma câmera para fazer pintura.
Por trás da atitude do foto-pintor, se escondia a idéia fixa de que a fotografia direta era simplesmente o produto de uma máquina e que, portanto, não era arte. Então, foram desenvolvidas técnicas especiais para combater a natureza mecânica de seu processo. Nesse sistema, o negativo era considerado como ponto de partida, uma primeira e tosca impressão que deveria ser melhorada manualmente, até fazer desaparecer os últimos vestígios de sua origem não artística. Como se, cantores reunidos em grupo numeroso pudessem convencer os músicos de que, os sons produzidos com suas máquinas não podem ser considerados como arte, devido à natureza essencialmente mecânica de seus instrumentos. Então o músico - seguindo o exemplo do foto-pintor - gravaria suas orquestrações em discos especiais, nos quais o som poderia ser manipulado, até transformar o produto de um bom instrumento musical numa pobre imitação da voz humana.
Para compreender porque essa atitude é incompatível com a lógica do sistema, precisamos reconhecer dois fatores básicos do processo fotográfico, que o distigue das demais artes gráficas: a natureza do processo de impressão e a natureza da imagem.

A natureza do processo de impressão.

A singularidade da fotografia, com relação às outras artes, se deve à instantaniedade de seu processo de impressão. O escultor, o arquiteto, o compositor, etc., têm a possibilidade de introduzir mudanças, ou agregar alterações, em seus planos originais durante a execução de seus trabalhos. Um compositor pode escrever uma sinfonia num grande espaço de tempo; um pintor pode passar toda uma vida executando um quadro e, no entanto, não considerá-lo acabado. Mas o processo de impressão em fotografia, não pode ser dilatado. Em sua curta duração não pode ser interrompido, alterado ou reconsiderado. Ao destampar sua lente todos os detalhes que se encontram em seu campo de visão são registrados, em muito menos tempo, do que levam os olhos para transmitir ao cérebro uma cópia similar dessa cena.



Natureza da imagem.

Dessa maneira, a imagem possui certas qualidades que a distinguem imediatamente como fotográficas. Em primeiro, a surpreendente precisão da definição, especialmente ao registrar pequenos detalhes; depois, a sequência ininterrupta da sutíl graduação do branco até o negro. Estas duas propriedades constituem as caracteríticas essenciais da fotografia; são próprias da mecânica do processo e não podem ser imitadas por nenhum trabalho manual.
A imagem fotográfica está mais para a natureza de um mosaico, do que para uma pintura ou desenho. Não contém traços, no sentido pictórico, por ser composta por pequeníssimas partículas. A extrema sensibilidade dessas partículas confere uma força especial à imagem e, quando essa força é destruída – pela intromissão de trabalhos manuais, por uma ampliação exagerada, pela utilização de um suporte rugoso, etc. –, se destrói a integridade da fotografia. Finalmente, a imagem se caracteriza pela luminosidade e brilho de seus tons, qualidades que não podem ser conservadas se as cópias são feitas em papel mate. Só uma superfície brilhante pode reproduzir satisfatoriamente a claridade resplandecente da imagem fotográfica.

A impressão da imagem.

Estas duas propriedades determinam o procedimento básico na atitude do fotógrafo. Já que o processo de impressão é instantâneo, e que a natureza da imagem é tal que não pode sobreviver a correções manuais, é óbvio que o positivo acabado deve ter sido criado, em sua totalidade, antes da exposição da película. Enquanto o fotógrafo não aprender a visualizar o resultado final com antecedência e a pre-estabelecer os procedimentos necessários para transportar essa visualização para a obra acabada – se o que se deseja é a fotografia em sua totalidade – estará sujeito a uma série de afortunados e desafortunados acidentes mecânicos.
Sua tarefa mais importante, e ao mesmo tempo mais difícil, não será conhecer sua câmera, revelar ou positivar, mas sim, ver fotograficamente. Isto significa aprender a ver - em termos da capacidade de seus instrumentos e de seus processos - de tal forma que possa traduzir instantaneamente os elementos e valores tonais de uma cena para a fotografia que pretende obter. Os foto-pintores acostumaram-se a afirmar que a fotografia jamais poderia ser uma arte pois, em seu processo, não havia nenhuma maneira de controlar os resultados. Atualmente, o problema de aprender a ver fotograficamente estaria bastante simplificado, se existissem menos possibilidades de controle do que aquelas agora existentes. Variando a posição da câmera, o ângulo ou a distância focal de uma lente, o fotógrafo pode conseguir um número infinito de composições possíveis do mesmo sujeito fixo. Mudando a iluminação ou utilizando filtros coloridos é possível alterar um ou todos os valores do sujeito. Variando o tempo de exposição, o tipo de emulsão ou o método de revelação, o fotógrafo pode mudar o registro dos valores tonais no negativo. E tais valores podem ser posteriormente modificados, durante a positivação, de acordo com a quantidade de luz que irá afetar as diferentes áreas do papel sensível. Assim, dentro dos limites de seu sistema, sem recorrer a qualquer outro método de controle não fotográfico – como, por exemplo, a natureza óptica ou química - o fotógrafo pode ir, desde um registro literal, até onde o desejar. Esta riqueza de facilidades de controle, muitas vezes, atua como limitante para um trabalho criativo. O que ocorre é que, relativamente poucos fotógrafos dominam seus sistemas. Pelo contrário, permitem que seus sistemas os domine e assim, percorrem um caminho sem fim, testando novas objetivas, novos papéis, novos reveladores - sem jamais conservar um item de seu equipamento pelo tempo necessário para conhecer todas as suas possibilidades – acabando por se perder num labirinto de informações técnicas, que é de muito pouca, ou nenhuma utilidade, até não mais saber o que fazer com tudo isso.
Só uma larga experiência permitirá ao fotógrafo subordinar seus conhecimentos técnicos aos objetivos da criação gráfica. Mas tudo isso pode ser conseguido, com muito mais facilidade, quando ele seleciona e mantém o equipamento e os procedimentos mais simples. Aprendendo a ver, limitando ao campo de uma só lente, à escala tonal de uma só película e um só papel, conseguirá muito melhor resultado que, amontoando conhecimentos superficiais sobre instrumentos variados.
Desde o início, o fotógrafo deve aprender a ver seu processo como um todo. Não deve se preocupar com a exposição correta ou com o negativo perfeito, etc. Estas considerações são apenas produto da mitologia publicitária. Deve aprender qual o tipo de negativo apropriado para conseguir um determinado tipo de positivo e também, qual a exposição e a revelação necessária para obter esse negativo. Quando souber como conseguir isso para um tipo de positivo, deverá aprender a variar esse processo para produzir outros tipos de positivos. Mais adiante, vai aprender a traduzir as cores para uma escala monocromática e a julgar a intensidade e qualidade da luz. Com a prática, este tipo de conhecimento passará a ser intuitivo. Finalmente, o fotógrafo saberá como ver uma cena ou um objeto em termos de resultado final, sem necessidade de pensar conscientemente em cada um dos passos necesssários para conseguí-lo.


Tema e composição.

Até agora, estivemos falando da mecânica da visão fotográfica. Agora veremos como é que esta visão se aplica ao tema e à composição. Não se pode fazer uma distinção drástica entre os temas apropriados para a fotografia e os temas apropriados para outras artes gráficas. Mas, sem dúvida, será possível, com base no exame de trabalhos realizados no passado e de nosso conhecimento das propriedades específicas dos sistemas, sugerir determinados procedimentos que poderão satisfazer melhor ao fotógrafo, e indicar outros, que fará bem em evitar.
Nem mesmo utilizando a mais perfeita técnica fotográfica, teria exito o trabalho desses foto-pintores. A fotografia é basicamente um meio honesto para registrar aspectos superficiais de um sujeito. Descobre o ator que se esconde por trás da maquiagem e expoe, tal como realmente é, o inventado, o trivial e o artificial. Mas a inerente honestidade da fotografia, dificilmente poderá ser considerada uma limitação, apenas por resultar de um impedimento para a realização de temas mais próprios da pintura. Por outro lado, oferece ao fotógrafo a possibilidade de olhar em profundidade a natureza das coisas e de presentear o sujeito em termos de sua realidade básica. Permite revelar a essencia do que está em frente à sua objetiva, com tal claridade de percepção, que o espectador pode chegar a encontrar a imagem recriada mais real e compreensível do que o próprio objeto.
É uma lástima, para não dizer mais, que a tremenda capacidade que tem a fotografia para revelar coisas novas, utilizando novos caminhos, seja ignorada pela maioria de seus máximos expoentes mas, assim é. Hoje em dia, a decadente influência da tradição pictórica foi substituída pela chamada psicologia de salão (N.Edit. – o autor se refere aos abundantes concursos e certames fotográficos frequentemente organizados por fotoclubes), que está exercendo a mesma limitação ao progresso da fotografia, sempre que estabelece falsas normas e desanima qualquer original vestígio de visões criativas.
Atualmente o fotógrafo tem necessidade de que sua imagem pareça uma aquarela para ser admitida como arte, porém, deve ficar atado às regras de composição. Este é o remédio contemporâneo. Mas, consultar regras de composição antes de fazer uma fotografia, é um pouco como consultar as leis da gravidade antes de sair para um passeio. Tais regras e leis se deduzem do ato realizado; são o resultado de uma reflexão e do exame a posteriori e, de maneira alguma, são partes do ímpeto criativo. Enquando um tema deve se enquadrar em alguns modelos preconcebidos, não poderá existir a expontaniedade da visão. Seguindo as regras de composição, sómente se obtem uma tediosa repetição de clichês pictorialistas.
Uma boa composição é só a forma de ver - com mais força - um determinado tema. Não se pode ensiná-la, como se ensinam os demais fundamentos criativos. É uma questão de amadurecimento pessoal. Como todos os outros artistas, o fotógrafo pretende que sua imagem final transmita aos outros uma resposta frente a um determindado tema. Para alcançar essa meta, seu maior trunfo reside na retidão do processo que emprega. Porém, essa vantagem só é válida, quando simplifica seu equipamento e sua técnica ao mínimo necessário e, enquanto permanecer liberado de toda a fórmula, dogma artístico, regra ou tabú. Só então será realmente livre para utilizar sua visão fotográfica no descobrimento da essência do mundo em que vive.
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O texto acima encontra-se, com outros igualmente adoráveis, em "Estética Fotográfica – una selección de textos", de Joan Fontcuberta (ed.) – Editorial Gustavo Gili, SA – Barcelona 2003. Foi publicado originariamente como Seeing Photographically, em The Complete Photographer , vol. 9, no 49 (1943) .
Tradução: Bento P. Bueno.
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